Infanticídio indígena: o universalismo dos direitos humanos em face do relativismo cultural

Autores

  • Paula Sperfeld UNINTER
  • Thieli Taiane de Carvalho

Resumo

O objetivo deste estudo é analisar o infanticídio indígena sob a ótica do universalismo dos direitos humanos, confrontada com a teoria do relativismo cultural. A questão orientadora da pesquisa é a seguinte: o infanticídio indígena afronta o direito à vida ou é apenas expressão cultural que deve ser protegida como parte das tradições desses povos? A hipótese é a de que o infanticídio indígena reflete um choque entre dois direitos fundamentais:  à vida e às manifestações culturais. Este último, previsto no artigo 215 da Constituição Federal, é reconhecido como garantia. Porém, tais direitos e garantias não estão hierarquizados. Os objetivos específicos são: discutir o direito a cultura enquanto um direito humano; elucidar a respeito da cultura indígena; descrever a comunidade indígena Yanomami e suas expressões culturais; abordar o universalismo dos direitos humanos, o relativismo cultural e o infanticídio como prática cultural das comunidades indígenas. As principais conclusões demonstram a necessidade de estudos aprofundados e abrangentes sobre todo e qualquer assunto, e, principalmente, os interesses por trás de todo discurso, ato ou projeto de lei que criminalize ou estigmatize culturas, como a indígena. Esta é uma pesquisa bibliográfica e documental que utilizou o método crítico-dialético, respaldada teoricamente em autores como Joaquin Herrera Flores, Boaventura de Sousa Santos, Paulo Freire, Laura Segato, entre outros. 

Palavras-chave: cultura indígena; relativismo cultural; eurocentrismo; epistemicídio.

Abstract

This paper objective is to analyze indigenous infanticide from human rights’ universalism perspective, confronted with cultural relativism theory. Research’s guiding question is as follows: does indigenous infanticide harm the right to life, or is merely a cultural expression that should be preserved as part of ethnic groups’ traditions? The hypothesis is that indigenous infanticide reflects a clash between two fundamental rights: to life and to cultural expression. The latter is foreseen in Federal Constitution’s Article 215, recognizes as a guarantee. However, such rights and guarantees are not hierarchical. The more specific objectives are: to discuss the right to culture expression as a human right; to clarify regarding indigenous culture; to describe Yanomami people and its culture expressions; to approach human right’s universalism, the cultural relativism, and the infanticide as indigenous people’s cultural practice. The main results show the need for in-dept and broader studies about the interests behind the discourses, acts, or bills that criminalizes or stigmatizes cultures, as the indigenous one. This bibliographical and documentary research used the critical-dialectical method, based on authors as Joaquin Herrera Flores, Boaventura de Sousa Santos, Paulo Freire, Laura Segato, among others.

Keywords: indigenous culture; cultural relativism; Eurocentrism; “epistemicide”.

Resumen

El objetivo de este estudio es analizar el infanticidio indígena desde la perspectiva del universalismo de los derechos humanos, confrontado con la teoría del relativismo cultural. La cuestión orientadora de la investigación es la siguiente: ¿el infanticidio indígena atenta contra el derecho a la vida o es solo una expresión cultural que debe ser protegida como parte de las tradiciones de estos pueblos? La hipótesis es que el infanticidio indígena refleja un choque entre dos derechos fundamentales: a la vida y a las manifestaciones culturales. Este último, previsto en el artículo 215 de la Constitución Federal, es reconocido como garantía. Sin embargo, esos derechos y garantías no son jerárquicos. Los objetivos específicos son: discutir el derecho a la cultura como un derecho humano; dilucidar sobre la cultura indígena; describir la comunidad indígena yanomami y sus expresiones culturales; abordar el universalismo de los derechos humanos, el relativismo cultural y el infanticidio como práctica cultural de las comunidades indígenas. Las principales conclusiones demuestran la necesidad de estudios profundos y amplios sobre todos los temas y, principalmente, los intereses que se encuentran detrás de todo discurso, acto o proyecto de ley que criminalice o estigmatice culturas, como la indígena. Se trata de una investigación bibliográfica y documental que utilizó el método crítico-dialéctico, sustentada teóricamente en autores como Joaquín Herrera Flores, Boaventura de Sousa Santos, Paulo Freire, Laura Segato, entre otros.

Palabras-clave: cultura indígena; relativismo cultural; eurocentrismo; epistemicidio.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Paula Sperfeld, UNINTER

Pós-Graduada em educação Especial e Atendimento Educacional Especializado. Graduada em Geografia e Pedagogia. Pós-graduanda em Saúde Pública e Humanização e Graduanda em Serviço Social pela UNINTER.

Thieli Taiane de Carvalho

Bacharel em Direito pela ESUCRI.

Referências

ANDRADE, Gabriela Augustha. Antropólogos indígenas propõem descolonização do pensamento para combater o epistemicídio. Universidade Federal de Minas gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2 ago. 2021. Arte e Cultura. Disponível em: https://ufmg.br/comunicacao/noticias/antropologos-indigenas-proproem-descolonizacao-do-pensamento-para-combater-epistemicidio. Acesso em: 13 set. 2022.

ANTONIO, Carolina Calzolari; DAL RI, Luciene. O relativismo cultural e a universalização dos direitos humanos no direito internacional público. Revista Paradigma, Ribeirão Preto, ano 22, v. 26, n. 2, p. 301-315, jul./dez. 2017. Disponível em: https://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:jEnR4RKhw98J:https://revistas.unaerp.br/paradigma/article/download/911/pdf/3816&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br. Acesso em: 27 set. 2022.

ARAÚJO, Sônia Maria da Silva. Cultura e Educação: uma reflexão com base em Raymond Williams. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 27., 2004, Caxambu. GT: Movimentos Sociais e Educação. Anais [...]. Caxambu: ANPED, 21-24 nov. 2004.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2023]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 7 ago. 2022.

CAMPOS, Yussef Daibert Salomão de. O patrimônio cultural e o protagonismo indígena na constituinte de 1987/88. Entrevista com Ailton Krenak. Horizontes antropológicos, Porto Alegre, ano 24, n. 51, p. 371-289, mai./ago. 2018. DOI https://doi.org/10.1590/S0104-71832018000200014

CIRINO, Carlos Alberto Marinho. Criminalização de práticas culturais indígenas: o caso Yanomami. Core (essencial), 2013. Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/304707072.pdf. Acesso em: 5 ago. 2022.

COSTA, Joaze Bermardino. A prece de Frantz Fanon: Oh meu corpo faça sempre de mim um homem que questiona! Civitas, Porto Alegre, v. 16, n. 3, jul./set. 2016. DOI https://doi.org/10.15448/1984-7289.2016.3.22915

DANNER, Leno Francisco; PERES, Juli Stéfane Dorrico. Um xamã Yanomami frente ao discurso filosófico- sociológico da modernidade. Estudos de literatura brasileira contemporânea, Brasília/DF, n. 53, p. 243-269, jan./abr. 2018. DOI https://doi.org/10.1590/2316-40185310

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2004.

GERHARDT, Tatiana Engel; SILVEIRA. Denise Tolfo. Métodos de pesquisa. Porto Alegre: UFRGS, 2009.

GLASER, André Luiz. Materialismo cultural. 2008. Tese (Doutorado em Letras) — Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8147/tde-03082009-151710/publico/ANDRE_LUIZ_GLASER.pdf. Acesso em: 2 nov. 2022.

GRANERO, Fernando Santos. Hakani e a campanha contra o infanticídio indígena: percepções contrastantes de humanidade e pessoa na Amazônia Brasileira. Mana, Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, p. 131-159, abr. 2011. DOI https://doi.org/10.1590/S0104-93132011000100006

GUIMARÃES, Antônio Sérgio Alfredo. Racismo e Anti-racismo no Brasil. Novos estudos, São Paulo, n. 43, 1995 Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4116181/mod_resource/content/0/A.%20S.%20Guimar%C3%A3es%20-%20Racismo%20e%20anti-racismo%20no%20Brasil.pdf. Acesso em: 7 ago. 2022.

HERRERA FLORES, Joaquin. A (re)invenção dos Direitos Humanos. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2009. Disponível em: https://www.patriciamagno.com.br/wp-content/uploads/2017/05/A-reinven%C3%A7%C3%A3o-dos-DH-_-Herrera-Flores.pdf. Acesso em: 19 set. 2022.

JORDÃO, Patrícia. A antropologia pós-moderna: uma nova concepção da etnografia e seus sujeitos. RIC – FFC, Marília, v. 4, n. 1, p. 35-51, 2004. DOI https://doi.org/10.36311/1415-8612.2004.v4n1.69

KABLUBITSKI, Lidia; JUNQUEIRA, Sérgio. Cultura de diversidade Religiosa diálogo necessário em busca de fraternidade universal. Interações: cultura e comunidade, Uberlândia, v. 5, n. 8, p. 123-139, 2010. Disponível em: https://www.redalyc.org/pdf/3130/313027314009.pdf. Acesso em: 7 ago. 2022.

KREKELER, Birgit et al. Para que serve o conhecimento se eu não posso dividi-lo? Berlim: Geb. Mann Verlag, 2013.

KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2020.

KOPENAWA, Davi; ALBERT, Bruce. A queda do céu: palavras de um xamã Yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.

LUCIANO, G. S. O índio brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos indígenas no Brasil hoje. Brasília, DF: Ministério da Educação, Secretaria de educação Continuada, Alfabetização e Diversidade; LACED/Museu Nacional, 2006. 232 p. (Educação para Todos; 12).

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica. São Paulo: Atlas, 2010.

MENESES, Paulo. Etnocentrismo e relativismo cultural: algumas reflexões. Gestão e políticas públicas – RG&PP, São Paulo, v. 10, n. 1, p. 1-10, 2020. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rgpp/article/download/183491/170496/480513. Acesso em: 24 out. 2022.

MILANEZ, Felipe et al. Existência e Diferença: o racismo contra os povos indígenas. Direito e práxis, Rio Janeiro, v. 10, n. 3, jul./set. 2019. DOI https://doi.org/10.1590/2179-8966/2019/43886

MOLL, Vera. Guerras do Brasil.doc. Uol, 2019. Disponível em: https://operamundi.uol.com.br/opiniao/60047/guerras-do-brasil-doc. Acesso em: 13 set. 2022.

OLIVEIRA, João Pacheco de. “Muita terra para pouco índio?”: uma introdução (crítica) ao indigenismo e à atualização do preconceito. In: SILVA, Aracy Lopes da; GRUPIONI, Luís Donisete Benzi (orgs.). A temática indígena na escola. Brasília: MEC;MARI;UNESCO, 1995.

PIOVESAN, Flávia. Proteção dos direitos sociais: desafios dos ius commune sul-americano. Rev. TST, Brasília, v. 77, n. 4, out./dez. 2011.

RODRIGUES, Guilherme Scotti. Direitos fundamentais, eticidade reflexiva e multiculturalismo: uma contribuição para o debate sobre o infanticídio indígena no Brasil. 2011. Tese (Doutorado em Direito, Estado e Constituição) — UnB, Brasília, 2011. Disponível em: https://repositorio.unb.br/handle/10482/9871. Acesso em: 13 set. 2022.

PAÍS tem 7 mil localidades indígenas e quase 6 mil quilombolas, estima IBGE. RBA (Rede Brasil Atual), 24 abr. 2020. Cidadania. Mapeamento. Disponível em: https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2020/04/pais-tem-7-mil-localidades-indigenas-e-quase-6-mil-quilombolas-estima-ibge/. Acesso em: 13 set. 2022.

RIBEIRO, Alessandra Stremel Pesce. Teoria e prática em antropologia. Curitiba: InterSaberes, 2016.

SANTOS, Boaventura de Sousa Santos. Uma concepção multicultural dos direitos humanos. Lua Nova, São Paulo, n. 39, 1997. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ln/a/gVYtTs3QQ33f63sjRR8ZDgp/?format=pdf&lang=pt. Acesso em: 25 out. 2022.

SEGATO, Rita Laura. Que cada povo teça os fios de sua história: o pluralismo jurídico em diálogo com legisladores. Direito.UnB, Brasília, v. 1, n. 1, p. 65-92, 2014. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/revistadedireitounb/article/view/24623. Acesso em: 7 ago. 2022.

SOUZA, Arão de Azevêdo. Debates sobre cultura, cultura popular, cultura erudita e cultura de massa. In: CONGRESSO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO NA REGIÃO NORDESTE, 12., 2010, Campina Grande. Anais [...] Campina Grande: Intercom, 10-12 jun. 2010.

TAVARES, Manuel. Boaventura de Sousa Santos e Maria Paula Meneses (orgs.) (2009). Epistemologias do sul. Revista Lusófona de educação, 2009. Disponível em: http://www.boaventuradesousasantos.pt/media/Revista%20Lusofona%20Educacao_2009.pdf. Acesso em: 13 set. 2022.

Downloads

Publicado

2023-06-07

Edição

Seção

Artigos